Só o louco é livre. Ninguém tira isso da minha cabeça. Só o louco é livre. O homem comum, ordinário, esse que você chama de “normal”, não sabe ser livre. E, pior que isso: ele é mentiroso, um mentiroso que vive dizendo estar em “busca da liberdade”, mas que, na verdade, se confina todos os dias em uma nova prisão inventada por ele mesmo. Não é de agora que o homem não suporta a liberdade.
Primeiro o homem criou um deus, isso mesmo, não foi Deus que criou o homem, foi o homem que criou Deus. Deus ao qual se tornou devoto e prisioneiro, e que, com rituais de reverencia, passou a encontrar sentido para sua vida sem sentido. Depois o homem criou o tempo. Ok, sei que você vai dizer que o tempo é definido pelas estações, pelas voltas do sol e da lua, ou essas coisas da natureza. Mas esse tempo não fora suficiente, o homem continuava solto demais, ele queria mais, e então, passou a contar os meses, as horas, os minutos e segundos. Quanto mais fragmentava o tempo, mais sentido o tempo fazia. Virou refém do tempo.
O homem criou a religião e seus mandamentos pra evitar cometer pecados, porque foi incompetente pra viver uma vida plena, de legitimo livre arbítrio. Claro, claro! É muito mais confortável se submeter às regras e andar nos eixos com a consciência livre da culpa. Mas ele não parou por aí, as regras da religião não foram suficientes. Então, o homem criou o Estado. Com o Estado e suas leis, julgamentos, penas e prisões, o homem conseguiria manter si mesmo na linha com muito mais rigor.
O homem também criou as coisas. E veja só! As coisas inverteram o jogo! Cada vez mais o homem pertence às coisas; e o homem adora pertencer às coisas, já que suas coisas – relógios, sapatos, carros, barcos, apartamentos – também dão sentido à sua vida. Não se trata de conforto, se trata de ter! Tenho, logo existo. Seu vazio interior, esse buraco frio na alma cada vez mais aberto e profundo, fez o homem domesticar os bichos. E, assim como as coisas, os bichos é que acabaram domesticando os homens. Homens, hoje, nem se dão conta, mas são eles os dependentes de seus pets. Dar banho, comprar ração, levar no veterinário, limpar coco e xixi. Tudo isso faz muito sentido pro homem e nenhum sentido pro cãozinho.
O homem que diz ser feliz não é feliz, é ocupado. O homem confunde felicidade com ocupação. Quer uma prova? Já ouviu aquele ditado: “Cabeça vazia é oficina do Diabo”? Ta aí! É o próprio homem confessando seu pavor por liberdade. Quanto mais o homem faz, mais ele se ocupa e, alimentando esse ciclo vicioso, mais se considera feliz. Se sente livre dentro da própria gaiola; fora dela, enlouquece completamente.
Tire todas as coisas do homem. Tire o carro, o relógio, o cachorrinho de estimação. Tire as leis, tire a religião, tire o tempo. Tire sua identidade, seu sobrenome, seu trabalho. Tire tudo. Deixe o homem nu e solte ele por aí, sem objetivos, nem ocupações. Deixe o homem livre, livre de tudo, livre de verdade. Acredite amigo, não vai demorar ate esse homem recriar seu Deus, seu tempo, sua religião, seu estado, suas coisas. Porque o homem não sabe ser livre. Só o louco é livre de verdade